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[ARQ] CONCURSO NACIONAL DE ARQUITETURA MUMA

M U S E U   M A R Í T I M O   D O   B R A S I L
“Navegar é preciso; viver não é preciso.” Fernando Pessoa

Atravessar...Desbravar...Vislumbrar...Descobrir....Conhecer. O projeto do Museu Marítimo do Brasil se inicia como uma travessia....lançando-se sobre as águas e navegando rumo a uma aventura na busca do descobrimento e no encontro do conhecimento que alcançamos no passado através das águas dos nossos rios e mares, e que deve servir de aprendizado para o presente e espelho para o futuro.
A história marítima brasileira foi e é parte fundamental na formação do nosso país, tanto nas suas esferas territoriais, sociais, políticas e econômicas, bem como simbólicas e culturais, constituindo-se em tema de enorme relevância educacional e social. 
O novo museu, através da curadoria da Marinha do Brasil, ao atuar no campo da memória histórica, cumprirá relevante função cultural e educacional, democratizando o acesso ao conhecimento e consciência do nosso passado e dos processos de formação. Um povo só pode construir sua identidade e projetar seu futuro a partir do conhecimento e reflexão das suas origens.

INSERÇÂO GEOGRÁFICA
A grande revitalização da área portuária do Rio de Janeiro, retomou para a cidade um enorme conjunto de valores simbólicos e econômicos: o tecido urbano central vê-se novamente frente à sua vocação primeira de estar voltado para o mar. A cidade reencontra sua própria história, sua origem, seu sentido, que é e sempre foi o de ser portal e porto do nosso país se inserindo no novo ciclo de desenvolvimento cultural brasileiro.
Ancorado no centro dessa enorme área, o píer da Marinha do Brasil onde será construído o Museu Marítimo do Brasil, encontra-se na orla histórica, em frente à Igreja da Candelária e à Capitania dos Portos do Rio de Janeiro e próximo a Praça Mauá e a Praça XV, interligadas por trajeto pedestre que margeia as águas da baía. 
CONCEITO
O Museu Marítimo do Brasil tem como seu objeto fundamental a história marítima do Brasil, seu passado, presente e perspectivas futuras, sua pluralidade e seu vasto espectro de abrangências. O mar como questão simbólica essencial na história humana, em qualquer tempo. Sua presença mitológica e simbólica no imaginário humano, a travessia das águas infinitas em busca de um outro lado do mundo, o encontro do horizonte e suas significações. 
O Museu Marítimo do Brasil, está pousado literalmente sobre o mar e pela localização geográfica e importância de sua temática deve se firmar como um novo marco arquitetônico para a cidade, integrado à paisagem e ao mesmo tempo potente dentro de uma simplicidade que sua posição no mar exige. Sua fonte de inspiração: a relação horizontal/vertical funciona como metáfora espacial e desencadeia uma lógica que enfatiza o horizonte no mar como dado real e absoluto, ao mesmo tempo que simbólico e intangível que abriga o mito do encontro entre Céu e Terra e a verticalidade no mar como presença inconfundível do homem.
A construção arquitetônica do novo museu configura uma narrativa espacial e semiótica, nunca sendo linear ou óbvia. Ela transita entre princípios opostos que se contrapõem, complementam e surpreendem simultaneamente. Os espaços internos do prédio exploram a ideia de jogo entre polaridades: claro/escuro, amplo/estreito, alto/baixo, cheio/vazio, transparente/opaco, água/terra/céu. Seu princípio fundamental é a composição entre volumes horizontais e verticais, convergente com a narrativa museológica e sua associação com o próprio espaço, estabelecendo uma lógica de percurso oferecida ao público visitante.
O terreno (píer) de 17 metros de largura por 280 metros de comprimento a ser ocupado pelo museu impôs à construção uma difícil característica, explorada favoravelmente: o prédio tem que ser estreito e longo, o que faz com que toda a sua ocupação seja sequencial e onde o visitante deverá percorrer uma trajetória linear. Em vez de tomar tais características como uma dificuldade, elas foram tomadas como valores que geram particularidades únicas. 
A ideia dos espaços em contraponto, intercalando as áreas de exposição como “caixas deslocadas” e as áreas de interstício como “respiros”, cria uma conformação espacial trabalhada em uma sequência que estabelece uma trajetória que é a metáfora de uma longa viagem, fazendo com que o visitante atravesse um caminho de surpresas, tanto em relação ao que é visto e exposto como em relação ao próprio espaço e as suas visuais para a água e terra, mar e cidade.
A arquitetura explora o sentido lúdico dessa travessia, como é a dos oceanos ou dos rios. Uma “ponte” conecta a praça frontal ao museu e com esse gesto prepara simbolicamente o visitante para a experiência que irá vivenciar reforçando a narrativa museológica, na ideia de um caminho a ser percorrido pelo visitante com começo, meio e fim.
O que é priorizado é o sentido e o conteúdo do museu (espaços expositivos) e não seus acessórios funcionais, a administração, serviços, restaurante, auditório e outros espaços de apoio não são protagonistas, mas servem de forma discreta às necessidades a que se referem. 
Os espaços expositivos são sucessivos, na ideia de uma longa travessia, aproveitando a forma alongada do próprio prédio. Essa sucessão de espaços estabelece uma perspectiva inesperada e não linear. 
Dentro das “caixas expositivas” poderão ser subdivididas salas com tamanhos e/ou alturas distintas. A passagem ou ligação entre elas não se dão sempre do mesmo modo, variando a posição e tipo de acesso. Os planos do piso e do teto podem também ser adaptados dentro do espaço, conforme necessidades de cada exposição. Como se estivéssemos em um submarino, algumas salas possuem acesso a platôs externos ou escada para acesso ao terraço do edifício, criando mirantes externos que possibilitam a visão da paisagem ainda como parte do percurso do museu. No intervalo entre as “caixas” existem interstícios que podem permitir extensão da função expositiva integrada a um ambiente de estar, ou simplesmente um espaço de “respiro”, onde as pessoas possam sentar, ouvir uma palestra, presenciar um evento ou vislumbrar as belas visuais como as escotilhas de um barco. O mar sempre está presente.
A galeria de exposições temporárias foi pensada independente de forma que possa estar separada da área expositiva permanente, facilitando o fluxo de público, que pode escolher visitar apenas um dos dois campos expositivos e foi posicionada ao lado da área de serviços, permitindo o livre acesso para trabalho museológico e acesso de montagem.
A incidência de luz natural é controlada, através de um sistema de sheds, que permitem a entrada da luz natural difusa que é filtrada através de um forro metálico em grelha suspenso. Assim se preservam as questões de conservação e permitem uso de projeções audiovisuais.
A questão do fluxo interno de foi pensado de forma a permitir confortável circulação de grupos de turistas, estudantes e de atividades educativas realizadas nas galerias, dividindo as circulações de entrada e saída dos visitantes, evitando-se assim uma grande e confusa aglomeração de pessoas nas duas direções. A largura de aproximadamente 4m permite também acesso de serviço para eventuais manutenções, retiradas e montagens de peças.
PARTIDO
O partido e programa se estrutura em 2 grandes eixos: 

Eixo Terra (do conhecimento)
Uma barra transversal suspensa, com acesso e áreas de uso público, demarca a implantação em forma de “cruz”, como quem toma posse da terra que descobre e cria uma passagem cênica e simbólica. 
O gesto de suspender essa barra tem duas intenções explícitas — identificar e permitir o acesso do visitante ao museu de forma clara e imponente, através de uma “ponte” retrátil suspensa por cabos de aço, que interliga continente e mar, criando de forma simbólica uma travessia que prepara o espírito do visitante para a experiência dentro do museu e ao mesmo tempo libera a visual integrando o edifício histórico da Alfândega ao conjunto do museu, conformando assim um grande complexo cultural marítimo e estabelecendo uma relação harmônica com a paisagem natural e os elementos edificados do entorno. 
Na praça em frente ao museu, se encontram o Carro de Combate Cascavel, Aeronave Skyhalk, Helicóptero SH3 e Lancha Balizadora Garoupa, como um pátio de esculturas que antecede a entrada. Ali ele se depara com a área de acesso, do setor Z3, aberto ao público, composto de recepção, bilheteria, lounge, café, loja, área de atividades educativas todas integradas e com livre acesso à “praça de embarque”, mirante para o mar e cais de onde saem as embarcações Rebocador Laurindo Pitta para passeios na Ilha das Cobras e Escuna Nogueira da Gama para a Baía da Guanabara. No piso superior, com fácil acesso, se encontram as demais áreas de uso público como auditório, sala multiuso, sala vip, restaurante com terraço mirante sobre o mar e a administração, todas envidraçadas e com tenso-telas micro perfurada de proteção solar. 

Eixo Mar (do descobrimento)
Como embarcações que se lançam ao mar o programa principal, setor Z1 de acervo público, foi dividido em 4 grandes “caixas” pousadas sobre o píer de 280 m e que abrigam as salas expositivas (passado – presente – futuro – temporário) e que recebem o nome em homenagem às embarcações que Pedro Álvares Cabral utilizou para aportar no Brasil: Santo Antônio, São Pedro, Nossa Senhora Anunciadora e Flor do Mar. 
A arquitetura proposta é fluida e dinâmica, reforçada através das circulações envidraçadas que permitem direta interação com o exterior intercaladas com as áreas expositivas, que são necessariamente mais fechadas, da alternância de pé-direito alto e baixo, e dos rasgos de vidro no piso e no teto que trazem a luz difusa do reflexo da água para dentro dos ambientes. 
O movimento de deslocamento das caixas cria um percurso surpreendente e estabelece relações visuais com o mar, como uma aventura ou descobrimento, na intenção de fazer o visitante perder a noção da estreita e longa forma do píer e dividir o fluxo de visitação expositiva, numa sequência lógica e contínua através do passado – presente – futuro, finalizando na sala de exposições temporárias, que pode ser acessada diretamente do lobby de acesso se desejado. A exposição de longa duração terá como peça importante e permanente a Galeota de D. João VI. Nos intervalos ente caixas e circulações laterais é possível ainda acessar as áreas externas de atracação das embarcações que permitem visitação ao longo do percurso — Navio Museu Bauru, Submarino Museu Riachuelo e Nau
dos Descobrimentos.
Na ponta extrema do píer, junto ao prédio da Alfândega, definimos o setor Z2 e Z4, ambos não abertos ao público, para o acesso de serviços, funcionários, carga e descarga, recepção de obras, reserva técnica e montagem, e no piso superior almoxarifados, refeitório e vestiários. Permite assim, maior segurança no recebimento de peças com direto acesso à área de exposições temporárias, bem como manutenção e acesso técnico às demais salas de exposição, que foram propositadamente dispostas sobre o piso térreo para permitir fácil acesso e entrada de embarcações, peças e objetos de maior porte.

PERCURSO EXPOGRÁFICO
Seguindo a estrutura arquitetônica, a expografia foi criada a partir de uma lógica de travessia de um espaço longilíneo que tem início em uma sala que antecede e introduz todo o percurso chamada “sala de batismo ou de iniciação no mar”. Nessa sala, através de meios audiovisuais, o público será metaforicamente lançado ao universo do mar e apresentado ao horizonte marinho e sua simbologia: descobrirá o que é estar cercado por horizonte que une água e céu.
Entre o início e o final da trajetória, haverá uma sucessão de espaços diferenciados e plurais, se instrumentalizando tanto de sistemas tradicionais expositivos como de sistemas tecnológicos audiovisuais. Ambos podem ser usados de forma alternada, complementando-se, como por exemplo uma sala de jangadas ou canoas pesqueiras, sucedendo-se uma de vídeos com documentação correlata complementando-se. A possibilidade de subdivisões internas nas caixas gera uma sucessão irregular de espaços - grandes e pequenos, proporcionando uma forma de museografia que se organiza através de um encadeamento e associações abertas entre os objetos.

ESTRUTURA

O partido estrutural do edifício é metálico e foi pensado de forma modular e racional.
A partir do módulo de espaçamento dos arcos da base do cais – 12m, se organizou uma malha projetual de 6x6m que se estende por todo o edifício, organizando os setores e espaços a partir dessa retícula. Nas caixas de exposição do Eixo Mar foi proposto um sistema de pórticos metálicos sequenciais, espaçados a cada 6m e com 12m de altura, gabarito máximo do museu em respeito às edificações históricas do entorno. Com 24m de largura os pórticos são apoiados sobre vigas metálicas que criam um piso elevado sobre o cais, expandindo a área expositiva de 18m sobre a água, com 4m de circulação interna e 2m de passarela externa de atracação de embarcações. Esses pórticos são intertravados por um conjunto de sheds que permitem o uso de iluminação e ventilação naturais de
forma controlada. Os intervalos entre as caixas, com áreas de estar e circulação são resolvidos por um sistema de grelha metálica 6x6m e vigas vagonadas com 30 cm.
No Eixo Terra, a barra suspensa é formada por duas grandes vigas verandel metálicas, com 6m de altura, que descarregam em 4 placas de suporte em concreto.
Todo o conjunto é complementado com pisos em steeldeck e vedações em steelframe, composto de painéis termo acústicos e fachada ventilada com painéis em cobre.
O edifício repousa sobre a estrutura do píer, com vigas metálicas apoiadas nas fundações existentes e área de atracação com cabeços para amarra e peças metálicas independentes da estrutura do edifício, fixados lateralmente sobre o muro de arrimo do píer, para evitar a transmissão de cargas laterais que pudessem ocasionar torções a estrutura do museu.

MATERIALIDADE
O edifício busca expressão plástica inspirada na arquitetura naval e portuária, presente no imaginário marítimo — embarcações, navios, containers, portos. 
Os elementos principais do projeto — as “caixas expositivas” possuem revestimento termoacústicos e pele exterior em fachada ventilada com painéis modulares em cobre esverdeado, cuja variação de tonalidade faz referência as cores da água do mar e suas várias nuances entre verde e azul. Internamente as caixas possuem estrutura modular metálica que marcam ritmo como as costelas estruturais dos barcos e navios, revestidos na parte superior com ripado em madeira de reflorestamento, que aquece visualmente o ambiente como as cabines de embarcações e na parte inferior com painel em chapa de drywall, permitindo pinturas e intervenções conforme as necessidades expositivas. No piso cimento queimado reguado cria uma paginação modular que orienta e organiza os layouts e placas de vidro nas tiras que se sobrepõe ao mar, refletindo a ondulação das marés para dentro dos ambientes de exposição.
Em contraponto à opacidade das caixas, todos os corredores de circulação e áreas de “respiro” são transparentes, em vidro laminado incolor permitindo total integração visual com o meio exterior do mar e céu. As esquadrias tem submódulo de 1,5m x 6m e reforçam a verticalidade e ritmo da composição.
As estruturas metálicas e a vedação em tenso tela micro perfurada da barra suspensa utilizam a cor vermelho vinho em uma alusão à pintura em óxido de cobre que era aplicada na parte inferior dos cascos dos antigos navios em madeira, que servia de proteção contra cracas e algas marinhas. Hoje em dia essa cor ainda está presente como honra a tradição náutica e marcação da linha de flutuação das embarcações.
Aportado no pier e rodeado por água por todos os lados, o visitante é remetido à ancestral relação entre o homem e o mar, como se estivesse no convés ou no interior de uma embarcação.
SUSTENTABILIDADE
O projeto arquitetônico do Museu Marítimo do Brasil, busca um equilíbrio entre a manutenção de um ambiente interno adequado para o funcionamento das atividades do museu e a conservação do meio ambiente. Um baixo consumo de energia, água, a redução e a correta destinação de resíduos durante a obra, bem como a seleção de materiais com base em critérios ambientais são itens relevantes para um melhor desempenho sustentável, podendo assim receber certificação LEED caso seja do interesse da instituição. Algumas estratégias importantes foram adotadas como:
— Sistema construtivo modular e pré-fabricado, permitindo otimização de materiais e peças.
— Sistema de captação e reuso de água das chuvas. Uso racional da água com aeradores e redutores de consumo.
— Otimização de iluminação e ventilação naturais. Uso de sheds em PVC translúcido de iluminação e exaustão nas caixas de exposição com sistema de controle e vedação quando desejável.
— Uso de energia renovável com instalação de placas fotovoltaicas. Luminárias em led e
equipamentos de eficiência energética.
— Seleção de materiais com teor de redução, reutilização e reciclagem. Painéis de vedação préfabricados, fachadas ventiladas, tenso-tela microclimáticas com membrana têxtil de poliéster micro perfurada. Vidros laminados de alta eficiência termoacústica.
— Redução da necessidade de uso de climatização nas áreas expositivas por sistema de ventilação passiva tipo efeito chaminé, com controle automatizado e regulagem de temperatura por sistema geotermal através da água do mar e bombas de troca de calor.
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Proposta para o Concurso Nacional do Museu Marítimo do Brasil desenvolvido pela equipe Antônio Abrão / Caio Mehl / Guilherme Schmitt / Victor Esc Read More

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